sábado, 12 de julho de 2014

Eu e os tunisinos



São quase seis da tarde, é Verão, está um dia de sol salteado com um vento q.b.. A fome começa a apertar e quatro miúdas perdidas numa cidade completamente desconhecida para elas tentam encontrar um tal de restaurante que alguém lhes falou que seria bom. Perguntam a vários locais, mas dizem-lhes, num inglês rudimentar e quase imperceptível, que é longe e terão que apanhar um táxi. "Mas tem a certeza que é assim tão longe? Não podemos mesmo ir a pé?", perguntam na esperança que alguém tenha feito confusão com outro restaurante qualquer, porque não lhes apetecia mesmo nada ter que apanhar um táxi naquele agradável final de tarde. Inesperadamente, saídos não se sabe bem de onde, um grupo de jovens animados e sorridentes aborda-as e pergunta se precisam de ajuda. Pela milésima vez lá explicam onde querem ir e mais uma vez a resposta não as satisfaz. "E se fôssemos a um restaurante aqui perto? Algum conselho?", perguntam. "E se viessem connosco?", atiram os jovens locais. Bem, a resposta a essa pergunta inesperada vai ter que ficar para depois, porque ainda são três horas e Tunes, a capital da Tunísia, ainda tem muito para ser explorado.

A antiga cidade de "Cartago", património mundial da UNESCO, e que ainda tenho bem presente dos livros de História do liceu, é paragem obrigatória em Tunes. Por apenas 10 dinar (cerca de 4€) é possível fazer uma visita pelos pontos mais interessantes de Cartago e que não foram completamente destruídos pelas várias guerras. Começámos por visitar o Museu e as ruínas que o rodeiam.






















Já estive em muitos museus em várias cidades do mundo e em todos eles, principalmente aqueles que albergam um património tão antigo e valioso como este museu, está fora de questão tocarmos nas peças. Mas não em Cartago! Aqui são os próprios seguranças/guias do museu que nos incentivam a tocar nas estátuas com séculos de existência. Eu toquei. Mas se visitarem Cartago daqui a uns anos talvez já não encontrem estas estátuas nas melhores condições por lá.









Mas Cartago é muito mais do que o museu. Cartago é também as "Vilas Romanas".












Ainda ficou muito por ver em Cartago. O anfiteatro, o teatro romano, as termas, entre outros, terão que ficar para uma próxima visita a Tunes.


Seguimos logo depois para "Sidi Bou Said". Estava curiosa em relação a este local porque todos me diziam que não poderia passar por Tunes e não ir esta vila pitoresca de casas caiadas de branco e de janelas e portas azuis. "Sidi Bou Said" faz lembrar uma qualquer ilha grega pelas cores e ambiente. A vila está cheia de restaurantes, cafés, e pequenas lojas com produtos típicos da Tunísia, onde os comerciantes atiram todo o seu charme aos turistas. E que charme! Aqueles vendedores são peritos na arte de namoriscar as estrangeiras, mas fazem-no com uma elegância e classe que nos levaria até a comprar um piaçaba.







Bombalouni, uma espécie de donut tunisino, muito muito saboroso





A pequena vila chama-se "Sidi Bou Said" por causa de um estudioso do Corão, que ali viveu. Alguém que dedicou toda a sua vida ao islamismo e que poderemos equiparar ao que para os católicos seria uma espécie de Santo. Explicaram-me que na Tunísia existem dezenas de pessoas que se dedicaram ao estudo do livro sagrado dos muçulmanos e que depois de mortas são idolatradas. Pelo que percebi, esta é uma questão polémica entre os muçulmanos e nem todos aceitam esse "endeusamento" de pessoas comuns. O estudioso Sidi Bou Said está sepultado na vila e é possível visitar o seu túmulo.





















E foi aqui, perto desta mesquita e desta rotunda que a minha visita a Tunes, que já estava a ser maravilhosa, melhorou ainda mais! Foi aqui que, ao final da tarde, enquanto procurávamos um restaurante, o tal grupo de jovens nos abordou e nos convidou para nos juntarmos a eles. Instintivamente, disse que sim e lá me juntei a eles. Fui sozinha. Podiam ser assaltantes, podiam ser assassinos, podiam ser traficantes de órgãos, podiam ser psicóticos, podiam ser muitas mais coisas. Mas não, eram só jovens normais, alegres e de bem com a vida. O entusiasmo deles contagiou-me de imediato e é por causa deles que o meu relato sobre a Tunísia tem mais umas quantas linhas e a memória desta visita irá perpetuar-se durante muito tempo. Explicaram-me que durante aquela semana estavam a fazer um workshop de meditação e ioga e que todos os dias tinham tarefas que pudessem de alguma forma torná-los melhores pessoas, como por exemplo: apanhar lixo nas ruas, oferecer flores na rua, ajudar turistas, etc. Estavam a tentar ser vegetarianos, deixar de fumar, não beber álcool, e levar uma vida segundo a filosofia "The Art of Living". O inglês deles não era o melhor e por isso muitas vezes exprimiam-se em francês, que eu não domino de todo, e eu respondia-lhes em inglês, e lá nos fomos entendendo. Subi de novo a estrada em direcção a "Sidi Bou Said" com os meus novos amigos, onde estaria o resto do grupo e os professores do workshop. Levaram-me a conhecer um local com uma vista incrível sobre o mar, porque Tunes é assim quase que uma ilha, onde nunca perdemos o mar de vista.



Descemos até à marina, sempre com aquele imenso mar azul à nossa frente.













O dia terminou com uma óptima pizza de atum para mim (vegetariana para eles, claro), um empate do jogo da Alemanha com o Gana, uma agradável conversa sobre a Primavera Árabe na Tunísia (os tunisinos suspiram por alguma estabilidade depois da revolução que aconteceu há mais de três anos, mas ainda agita o país). O serão acabou com uma guitarra ao luar a embalar-nos com canções de liberdade e revolução. A viagem terminou com uns amigos para a vida!