domingo, 5 de abril de 2015

Bienal de São Paulo



São Paulo não é de todo uma das minhas cidades preferidas no mundo. Mas tenho que admitir que a oferta cultural da cidade transpira por todos os seus poros. Há sempre uma exposição, um concerto, uma peça de teatro, uma apresentação de um livro, uma conferência, um debate de ideias acontecendo na gigante metrópole brasileira. E, além disso, muitos dos eventos são gratuitos. São Paulo obriga-me a pensar, intriga-me, questiona-me e provoca-me, e eu gosto disso.

A minha segunda visita a São Paulo coincidiu com a 31ª Bienal que tomou de assalto o pavilhão do Parque Ibirapuera de Setembro a Dezembro de 2014. O tema escolhido foi "Como (...) coisas que não existem". Ali, entre parêntesis, no lugar das reticências, cabe um sem número de verbos limitados apenas pela imaginação de cada um.

A entrada no pavilhão é gratuita e ainda é possível fazer a visita com guia e trocar experiências e pontos de vista com o pequeno grupo que se forma para cada visita guiada.







Uma das instalações que mais me impressionou e intrigou estava logo na entrada da 31ª Bienal. Não foi nem preciso subir as escadas e entrar de facto nas salas da exposições. Ali mesmo, ao pé da porta, onde apenas a fachada de vidro separa o verde da relva do parque do chão concreto do pavilhão. A instalação era dedicada ao útero. Sim, esse tão controverso órgão feminino sobre o qual todos têm uma opinião. O meu choque inicial foi perceber que, no Brasil, o aborto ainda é acto criminoso. Qualquer mulher brasileira que deseje interromper voluntariamente a sua gravidez é criminalizada por esse acto. E isso impede alguém de fazer um aborto? Claro que não. Como em todos os lugares do mundo em que o aborto é considerado um crime, o aborto é praticado de forma ilegal pondo em risco a vida das mulheres que desesperadamente se submetem ao procedimento em clínicas de vão de escada. Ou então pior: aquelas mulheres que decidem resolver o assunto pelas próprias mãos, recorrendo a métodos caseiros e primitivos. É precisamente esses testemunhos que o autor ou a autora da instalação foi buscar e convida-nos a entrar dentro do útero de cada uma dessas mulheres para ouvir o seu lamento, o seu pedido de socorro. Não apenas por elas, que de uma forma ou de outra fizeram um aborto, mas por todas nós.

"Espaço para abortar"



Subindo as escadas e entrando propriamente na exposição, as salas sucedem-se umas às outras, sem haver um tema em comum, ou sequer um fio condutor que as ligue. Algumas instalações são um pouco bizarras e o seu significado não é facilmente identificável, por isso vamos discutindo com a guia o que o artista terá querido expressar na sua forma artística. O significado fica ao critério de cada um e tudo é válido.














Para mim, a Bienal de São Paulo foi um descobrir e aprender coisas que existem na cultura e sociedade brasileira, e sul americana no geral, mas fingimos não existirem, por preguiça de aprender ou pura ignorância.